Pensar a criança hoje é um grande desafio. Pais e educadores deparam-se com os pequenos cada vez mais ativos, exploradores e curiosos, fruto do meio de múltiplas influências e necessidades, no qual estamos integrados. É comum ouvir relatos que dizem: as crianças de hoje já não sabem brincar...Joaska/Stock.xchng Neste sentido, dizemos que as crianças sabem, e brincam, embora não seja da mesma forma e com as mesmas brincadeiras que fizemos enquanto crianças, ou as brincadeiras realizadas nos tempos dos nossos pais e avós. O ser humano é social, aprende e reproduz o que vivencia e a ludicidade faz parte da constituição humana, seja relacionada ao prazer e ao lazer, a qual se estrutura e vivencia de diferentes formas durante toda a vida. Brincar aprende-se. E quem ensina as crianças a brincar hoje? Os ambientes mudaram, muitas das crianças já não desfrutam os mesmos espaços (dos pátios das casas para a convivência em apartamentos e condomínios, redução da possibilidade de brincar na rua, espaços públicos, etc.) e nem as mesmas vivências, pois convivem com menos irmãos (ou nenhum), menos primos, e estão experimentando cada vez mais cedo a inserção das tecnologias (TV, computadores, internet, jogos, telemóveis) e é com estes aparatos tecnológicos que muitas das crianças hoje aprendem a brincar. É preciso também compreender que esta criança está muito mais cedo inserida no ambiente escolar, que não pode ignorar as suas especificidades, que vivencia diferentes formas lúdicas, aprendidas em diferentes contextos, que pode variar desde a bola e a boneca, ao tablet. Assim, este ambiente escolar deve estar organizado de forma a que a criança possa brincar, explorar seu corpo em movimento, aprender e comunicar-se a partir de sua prática corporal, pois a criança pequena relaciona-se com o mundo agindo sobre ele, explorando e experimentando, e desta ação organiza seu pensamento. A exploração do corpo e do movimento é a primeira forma de linguagem e de brincar da criança, e precisa ser aproveitado na escola para a estruturação de uma aprendizagem efetiva, prazenteira e articulada às capacidades infantis. As pesquisas que realizamos em ambientes de Educação Infantil mostram-nos que o ensinar à criança pequena a brincar se constitui em um dos grandes eixos neste nível de ensino, e observamos que o entendimento dos professores quanto a ludicidade precisa compor elemento de estudo e reflexão nos cursos de formação e no âmbito da prática pedagógica. Se o brincar é aprendido, a escola assume assim grande responsabilidade quanto as interações, tanto ao brincar pela exploração dos diferentes ambientes, quanto as situações de brincar propiciadas pelos educadores, sejam elas livres ou dirigidas, com ou sem brinquedos, com cantigas, jogos, imitações, histórias ou exploração de aparatos tecnológicos. A disponibilidade de brincar do educador é um fator importante para a efetivação do lúdico na prática pedagógica, e precisa estar articulada a formação teórica sólida quanto aos componentes do processo ensino aprendizagem, que perpassam a psicologia, por meio das teorias de desenvolvimento, aprendizagem; da sociologia, mediante o reconhecimento da criança e sua cultura; da biologia, relacionadas as estruturas físicas e da didática, que permita ao educador reunir estes e demais elementos relacionados ao ensinar e a criança para organizar um planejamento e efetivar uma prática educativa verdadeiramente articulada a ludicidade e a aprendizagem e vinculadas as especificidades da criança hoje, bem como com as experiências do educador quanto ao brincar, revivendo situações lúdicas já vivenciadas e se apropriando de novas formas de brincar. Compreendemos, assim, que uma prática pedagógica lúdica está relacionada a capacidade de exploração do brincar propostas pelos educadores, bem como as possibilidades estruturais propiciadas pela escola. O brincar, o corpo e o movimento devem integrar reflexões e práticas tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Básico, pois a alfabetização, eixo central dos primeiros anos de escolarização está diretamente relacionada com a vivência corporal e as experiências com o brincar. É importante refletir sobre as práticas relacionadas ao brincar na escola, diante da necessidade de romper as amarras que se constituíram ao longo do tempo, na estruturação dos espaços escolares e das práticas pedagógicas, possibilitando a reflexão e a ação a partir do entendimento de que a criança brinca e aprende a partir de seu corpo, de que a imobilidade, as rotinas e a disciplina constituída não é algo natural, e que pode, e deve ser rompida, para que possamos superar paradigmas e pensar na educação da criança real, que explora, age, sente e pensa a partir de seu corpo.
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