Por Palmira Simões O rápido avanço tecnológico da ainda curta era digital tem trazido muitos benefícios à educação e principalmente, a partir da Web 2.0, inúmeros desafios. O mundo digital não tem fronteiras e encontra-se cada vez mais acessível (na maior parte dos casos de forma livre) a milhões de utilizadores de todos os cantos do planeta onde haja uma ligação à internet. Além disso, está ligado em rede e a comunicar não só de forma assíncrona mas ainda escrita, verbal e visualmente “na hora”, ou seja, de forma síncrona. A informação é partilhada e pode ser construída, individual ou colaborativamente, por qualquer internauta, instituição ou organização. Multiplicam-se as ferramentas, programas informáticos e aplicações que podem transformar um pequeno ecrã de um telefone móvel numa enorme sala de aula aberta à escala mundial. A biblioteca já não é só aquela divisão, por vezes distante e de difícil acesso, que alberga um “pequeno” acervo empoeirado de livros e documentos em papel, mas também uma imensa “nuvem” onde, à distância de um clique a qualquer dia e hora, se encontra uma quantidade imensurável de conteúdos em diversos suportes (escritos, imagens, audiovisuais…), nas mais variadas línguas. Milhões de pessoas agrupam-se e interagem massivamente em redes sociais virtuais como o Facebook. Existe assim todo um admirável mundo novo a descobrir, com potencialidades capazes de — como expõe o investigador J. A. Moreira no livro de Alexandra Okada, Competências-chave para Coaprendizagem na Era Digital: fundamentos, métodos e aplicações — “enriquecer a aprendizagem ao longo da vida” ao proporcionar “a oportunidade de aceder e de construir conhecimento através da web” com, por exemplo, recursos educacionais abertos e cursos massivos online. Mas para se tirar o melhor dos partidos desta janela de oportunidades, e como disse o sociólogo Manuel Castells em 1999, esta vivência em rede e coaprendizagem requerem “o desenvolvimento de competências para que os participantes possam compartilhar experiências e realmente construir conhecimentos em conjunto e em larga escala”.
Para que isto seja concretizável na sua plenitude, Okada refere no seu livro três fatores catalisadores da educação neste contexto e várias competências-chave essenciais. Assim, e no que concerne aos fatores catalisadores, o primeiro é o da abertura da educação, isto é, aquela que permita disseminar a aprendizagem em larga escala, eliminando barreiras, maximizando a disponibilização livre e pública de materiais educacionais, de pesquisas científicas, de tecnologias e cursos gratuitos (ex: Recursos Educacionais Abertos – REA); o segundo fator diz respeito à grande flexibilidade proporcionada pelos dispositivos móveis, pelos recursos integrados ou distribuídos em nuvem, como também pelos ambientes personalizados. Ou seja, deve ser possível aceder-se à informação a qualquer dia e hora, a partir de qualquer local ou dispositivo (ex: smartphone), possibilitando a livre gestão do espaço virtual e das aprendizagens; por último, surge o fator da inclusão promovida por organizações governamentais e não-governamentais através de projetos de construção de cidades digitais para o acesso público à internet (acessível a todos os cidadãos) ou de programas de inclusão digital para formação ao longo da vida. Ainda segundo a autora, estes três fatores, para além de favorecerem a acessibilidade e a construção do conhecimento, permitem ainda o desenvolvimento de competências-chave que deem às pessoas ferramentas nos seus domínios constitutivo, interpessoal e cognitivo (instrumental e operacional) para que coaprendam e coinvestiguem através da Educação Aberta na era digital. Entre essas competências, destaque para a necessidade de reforço da Literacia Digital, da Colaboração-Comunicação, do Pensamento Crítico-Criativo e da Literacia Científica. Na perspetiva de J.A. Moreira, as redes sociais como o Facebook e outras “podem potenciar a comunicação e a partilha de informação e conhecimento”, para além de fomentarem “o desenvolvimento de capacidades e estratégias de ensino/aprendizagem mais dinâmicas e interativas, abertas e criativas” e ao mesmo tempo possibilitarem “uma maior participação dos intervenientes, um melhor aproveitamento dos recursos e mais mobilidade de informação e reconhecimento”. Estas e outras reflexões têm dado azo à realização de estudos nos diferentes níveis de ensino, desde o básico ao superior. À semelhança de Moreira, Minhoto & Meirinhos também consideram que “a escola não se pode alhear da realidade que a circunda, pois a presença das redes sociais no quotidiano dos alunos é incontornável e percetível […] e pode tirar partido deste interesse e canalizá-lo para a aprendizagem […]. Segundo estes autores, são várias a vantagens para os alunos que os ambientes colaborativos de aprendizagem apresentam, quer a nível pessoal (aumento de competências sociais, de interação, do pensamento crítico, da autoestima, etc.), como a nível da dinâmica de grupo (reunindo propostas e soluções de vários grupos de alunos, incentivando os estudantes a aprender entre eles e a valorizar os conhecimentos dos outros, etc.). Para analisar em que medida as redes sociais promovem a aprendizagem colaborativa na escola, Minhoto & Meirinhos realizaram, em 2011, um estudo numa turma do 12º ano (ensino secundário), composta por 15 alunos do curso Humanístico de Ciências e Tecnologias, na disciplina de Biologia. Esta turma criou uma página no Facebook, Biologia12 (www.facebook.com/Biologia12), na qual publicou diversos recursos, como notas, vídeos, fichas, fotos, etc., tendo ainda criado fóruns de discussão sobre assuntos relacionados com os conteúdos curriculares da disciplina. Os autores mediram a participação e o envolvimento dos alunos nesta experiência de aprendizagem colaborativa através de uma rede social, tendo concluído que estas possuem ferramentas que permitem criar o contexto necessário para que essa aprendizagem aconteça. Referem que a familiaridade dos alunos com a rede bem como o facto de eles se identificarem com o processo são dois fatores facilitadores, para além de que a utilização da rede no ensino-aprendizagem contribui para a emergência da consciencialização de que a construção do conhecimento depende de todos eles e não apenas do professor. No entanto, e de acordo com Moreira, a integração plena desta ferramenta na escola confronta-se ainda com uma série de dificuldades e resistências: tecnologia recente e incompreendida como ambiente de aprendizagem; necessidade de alterar a compreensão dos processos de interação social e na construção da aprendizagem e do conhecimento; necessidade de mudança na forma como se usa a tecnologia educativa; na organização e no paradigma educacional (ex: ensino centrado no estudante); número limitado de professores entusiastas pelo uso das redes; instituições ainda pouco despertas para esta realidade. A importância de olhar a educação como um todo Sem descurar as partes, antes conjugando-as, a experiência da educação deve ser global (plano individual, económico-socio-cultural, histórico…). Mais concretamente, tanto no âmbito cognitivo (aprender a conhecer) como no prático (aprender a fazer), como a nível do indivíduo enquanto pessoa (aprender a ser) e membro da sociedade (aprender a viver juntos), ou ainda no campo do conhecimento (ao nível do contexto, do global, do multidimensional e do complexo) e da inteligência geral. De facto, a educação dever favorecer a criatividade/a aptidão natural da mente para a resolução de problemas. E é precisamente com uma educação focada não apenas no conhecimento mas também nas pessoas (tendo em conta a sua diversidade), nas comunidades (considerando a sua heterogeneidade) e nos seus problemas e complexidades (multidisciplinares, transversais e globais) que se consegue construir uma sociedade mais justa, na qual todos tenham acesso às mesmas oportunidades, direcionada mais para projetos e objetivos comuns do que individuais, promovendo assim a vinculação relacional, a cooperação, a solidariedade, a equidade e a paz. Urge, assim, uma mudança das políticas educativas atuais… Para saber mais DELORS, Jacques et al (1996). “Os quatro pilares da Educação” in Educação, um Tesouro a Descobrir (Cap. IV). Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Brasil: Cortez Editora/UNESCO, 1997. MINHOTO, P. & MEIRINHOS, M. (2011). “As redes sociais na promoção da aprendizagem colaborativa: um estudo no ensino secundário”. Educação, Formação & Tecnologias, 4 (2), 25-34 [Online], disponível em http://eft.educom.pt/index.php/eft/article/view/227. MOREIRA, J. António et al (2014). Educação à Distância e eLearning na Web Social (2ª edição). Santo Tirso: Whitebooks. MORIN, Edgar (1999). “Os princípios do conhecimento pertinente” in Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro (Cap.II). Brasil: Cortez Editora/UNESCO, 2000. OKADA, Alexandra (2014). Competências-chave para Coaprendizagem na Era Digital: fundamentos, métodos e aplicações. Coleção Estudos Pedagógicos – Dinâmicas Educacionais Contemporâneas. Santo Tirso: Whitebooks.
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