Alimentar bem (e barato) as crianças

Em época de crise, de desemprego 
e com falta de dinheiro nos bolsos, 
um dos problemas que mais preocupam 
os pais é a alimentação dos seus filhos

Ciente desta angústia, ABCriança falou com a nutricionista Ana Leonor Perdigão, que referiu categórica: “Comer de uma forma saudável e equilibrada não significa gastar muito dinheiro. Pelo contrário, sai muito provavelmente mais barato!”

Truques certeiros
- Utilizar produtos da época – mais saborosos e mais baratos e até mais amigos do ambiente;
- Evitar excessos – preparar refeições na quantidade certa e necessária ajuda a manter o peso adequado e a poupar no orçamento;
- Aproveitar as sobras das refeições – se mesmo assim sobrou comida aproveite para outra refeição, reaquecida ou transformada;
- Começar a refeição sempre com sopa de legumes – a sopa é um prato muito barato e ajuda a equilibrar a refeição e o dia alimentar por aumentar a saciedade e ajudar a comer menos do prato que se segue;
- Planear as refeições com antecedência – permite ser mais criativo e adquirir atempada de todos os ingredientes

Imagem: Anetta/Photoxpress

Dieta-tipo: algumas orientações gerais segundo a idade

1-3 anos
Pequeno-almoço: 1 biberão ou 1 papa de cereais.
Almoço: sopa de legumes progressivamente menos passada; prato com separação de componentes: carne ou peixe ou ovo; arroz ou massa ou batata; legumes cozidos ou salada; 1 peça de fruta; água para beber.
Jantar: manter perfil do almoço mas alternando carne e peixe entre as duas refeições.
4-12 anos
Pequeno-almoço: alternar em diferentes dias: cereais de pequeno-almoço com cereais integrais + leite meio gordo; pão com queijo ou fiambre ou manteiga + leite meio gordo simples; sempre 1 peça de fruta. 
Almoço: sopa de legumes (não triturada!). Prato com: carne ou peixe e/ou ovo; arroz/massa/batata; legumes cozinhados ou salada; 1 peça de fruta; água para beber
Jantar: manter perfil do almoço mas alternando carne e peixe entre as duas refeições.

Atenção: em certos casos a alimentação poderá ter de sofrer alterações, em função, por exemplo, do peso da criança.

Surgem, com frequência dúvidas, acerca da substituição de alimentos, que Ana Leonor Perdigão esclarece:
Alguns alimentos são muitas vezes sobrevalorizados sem que haja qualquer justificação nutricional para isso. É o caso do grupo das carnes, alimentos que frequentemente são consumidos em excesso. Para um adulto são suficientes cerca de 130-150 g de carne ou equivalentes por dia o que está francamente abaixo do que é visto como ideal pela maioria das pessoas. 
Através da Roda dos Alimentos é possível, de uma forma muito fácil, ter ideia dos alimentos cujos principais nutrientes são comuns e que portanto podem desempenhar o mesmo “papel” no dia alimentar. Dentro de cada grupo da Roda os alimentos são nutricionalmente equivalentes e por isso podem ser substituídos entre si. Por exemplo, no grupo das carnes, grandes fornecedores proteicos mas também de algumas vitaminas e minerais, temos as carnes vermelhas, as carnes brancas, o peixe e os ovos. Ou seja, numa semana bastará comer 1 vez carne vermelha (e não tem de ser de vaca) para se cumprir a regra da variedade. Os ovos, muitas vezes vistos como um simples complemento de carne ou peixe podem e devem ser utilizados como elemento proteico único da refeição. Um ovo equivale a cerca de 30 g de carne. 

Entre grupos diferentes também é possível encontrar alimentos que devidamente conjugados podem substituir outros fora do seu grupo. A soja, as leguminosas secas e os cereais são alimentos com um elevado teor proteico que podem ser um bom complemento ou até substituto dos produtos do grupo das carnes e peixe. Contudo há que assegurar devidamente essa complementaridade para que não surjam carências nutricionais, principalmente quando falamos de crianças.
Numa alimentação equilibrada e saudável, devem estar presentes de forma regular todos os grupos da Roda, ou seja, todos os grupos da Roda são essenciais mas nem todos os alimentos são imprescindíveis. No caso das crianças destacaria como essenciais os laticínios, o grupo das carnes e peixes, os hortícolas e as frutas porque estes são por norma os que mais frequentemente são esquecidos ou pouco apreciados.
Pensando no preço normalmente os alimentos mais “simples” como as carnes brancas ou o peixe como a pescada são mais baratos e muitas vezes até mais saudáveis. Os ovos são também uma boa opção com a vantagem de serem bastante apreciados e não há qualquer contra-indicação para se consumirem várias vezes por semana.

Lanches e pequenos-almoços: 
alimentos que não podem faltar
O pequeno-almoço é uma refeição extraordinariamente importante e também uma das costuma criar mais dificuldades às famílias. De manhã, o sono costuma sobrepor-se à vontade de comer e o relógio sempre a contar também não ajuda. Pela importância que tem esta refeição para o rendimento físico e intelectual e para o bem-estar de todos é necessário encontrar soluções ajustadas a cada caso para que esta refeição não falhe: alimentos fáceis de preparar e rápidos de ingerir, saborosos e apreciados pelas crianças e que ao mesmo tempo garantam os nutrientes necessários.

Nutrientes a não esquecer no pequeno-almoço: cereais ou derivados como o pão; leite ou equivalentes e fruta. Ao contrário do se pensa, os cereais de pequeno-almoço não são mais caros do que uma opção de pão com queijo, ou fiambre ou manteiga. Uma taça de cereais (30 g) com leite meio gordo (125 ml) custa menos de 30 cêntimos e têm a vantagem de serem fáceis de preparar e comer, sem birras e sem atrasos. Pão com manteiga é um pequeno-almoço muito comum mas pouco rico do ponto de vista nutricional. Seja como for a escolha (cereais de pequeno-almoço ou pão) deve recair em opções menos refinadas, idealmente com cereais integrais por serem mais completos e nutritivos. 

Preparar os lanches para a escola é uma excelente forma de poupar e também de garantir equilíbrio nutricional e variedade nas refeições intercalares. 
Nestas refeições, o pão (de mistura, por exemplo) com variados complementos ao longo da semana (doce, manteiga, queijo…) ou uma barrita de cereais são fundamentais para garantir a energia que eles necessitam. Um pacotinho de leite simples ou pontualmente com aroma (baunilha, morango, chocolate), um iogurte ou até de vez em quando um néctar são igualmente boas opções para os lanches. 

Que fazer com crianças “esquisitas” ou “niquentas”?
É natural no ser humano alguma “desconfiança” às coisas que não conhece e com os novos alimentos esta regra também se aplica e designa-se por “neofobia”. As cores, as texturas e os sabores de alimentos desconhecidos provocam algumas reticências que podem ser ultrapassadas.
Algumas dicas para ultrapassar as dificuldades:
- Dar o exemplo é essencial para não se perder a credibilidade! Se os pais não comem sopa ou brócolos porque há-de a criança fazê-lo? 
- Persistência por parte dos pais que devem continuar repetidamente a apresentar os novos alimentos, em refeições espaçadas de alguns dias. Dizem os estudos que ao fim de 7-8 contactos com o alimento a crianças passa a aceitá-lo e eventualmente até a gostar de o consumir;
- Envolver a criança na compra ou preparação dos alimentos, quando isso for viável, é uma forma de tornar o alimento menos desconhecido para ela.
- Evitar que os alimentos sejam usados como recompensas ou castigos. O pior que pode haver para a “imagem” da sopa” é fazer dela a moeda de troca para a sobremesa doce. Cada alimento tem o seu papel e o mais importante é que possamos comer de tudo, nas devidas quantidades.
- Tornar as refeições divertidas através da apresentação dos pratos.
- Evitar as “batalhas” à mesa, que deixam todos irritados e não ajudam aos objetivos! Nestas circunstâncias, será aconselhável mascarar sabores com ervas aromáticas ou especiarias para levar a criança a apreciar determinados alimentos? A nutricionista clarifica: 
Os primeiros anos de vida determinam uma grande parte do nosso padrão alimentar de adultos. É a fase de conhecer e experimentar novos sabores e texturas e de desmistificar algumas destas coisas. Alimentos que não experimentamos na infância ou que não experimentamos vezes suficientes para gostar deles são normalmente “banidos” para sempre dos nossos hábitos. Quantos adultos conhecemos que dizem não gostar de ervilhas e que afinal nunca experimentaram ou já nem se lembram da última vez que tentaram comer? O ideal será conhecermos os sabores dos alimentos e não mascará-los. Cada alimento tem o seu sabor próprio e é isso que faz dele único no nosso paladar. Desde cedo devemos conseguir identificar e apreciar os sabores de cada ingrediente.

No entanto também é verdade que não temos de gostar de tudo da mesma forma e por vezes torna-se necessário “dar uma ajuda”. As ervas aromáticas e até algumas especiarias são elementos com sabores muito marcados que podem tornar mais apetecíveis outros alimentos com sabores menos intensos ou menos apreciados. Se nos adultos ervas aromáticas e especiarias são boas formas de mascarar por exemplo a redução do sal no caso das crianças o ideal é que elas nunca tenham sido habituadas a teores elevados deste elemento. Há ainda a agravante de muitas vezes as crianças também não apreciarem os sabores marcados das próprias ervas aromáticas…
Em suma, na alimentação das crianças ervas aromáticas, sim, como ingredientes habituais e de valor próprio na preparação das refeições. Não tanto para “mascarar” outros sabores. Especiarias… com alguma moderação. 


O nosso “cabaz”
Nutritivos, saborosos e económicos: alimentos que não devem faltar e que nas porções adequadas não são assim tão pesados no orçamento:
1. Leite ou derivados
a. 1 copo de leite (250 ml) = 0.15 €
2. Hortícolas 
a. alface (1 porção de 180 g) = 0.18 €
b. brócolos (1 porção de 140 g)= 0.25 €
c. cenoura (1 porção de 180 g) = 0.06 €
3. Frutas
a. 1 laranja (160 g) = 0.12 €
b. 1 pera (160 g) = 0.11 €
4. Cereais e derivados (pão, arroz, massa)
a. pão de mistura (1 bolinha de 50 g) – 0.20 €
b. cereais de pequeno-almoço (1 taça de 30 g) – 0.21 € 
c. arroz (1 porção de 35 g em cru) – 0.25 €
d. batata ( 1 porção de 125 g) = 0.10 € 
5. Carnes, peixe e ovos
a. Bife de frango (1 porção de 30 g) – 1.74 €
b. Pescada congelada (1 porção de 30 g) – 1.5€
c. Ovo (1 unidade) – 0.15€

Nota. As porções apresentadas seguem as orientações da Roda dos Alimentos. Esta listagem não representa um dia alimentar mas apenas o custo por porção de acordo com a Roda dos Alimentos.

Saber mais. Para receitas saudáveis para crianças sugere-se o livro Dieta sem castigo, da nutricionista Paula Veloso, um dos 18 finalistas selecionados pela Gourmand World Cookbook Awards, em 2006. 
Para sugestões de receitas saudáveis e a baixo custo pode consultar o site da Associação Portuguesa de Nutricionistas:http://www.apn.org.pt/scid/webapn/defaultCategoryViewOne.asp?categoryId=885