Por Palmira Simões Violência sobre crianças: as notícias veiculadas pela Imprensa que nos chegam quase todos os dias refletem uma realidade assustadora não só pela sua frequência mas porque acontece na esmagadora maioria dos casos ao nível da família. O pai e a mãe que em teoria representam figuras protetoras transformam-se na ameaça. Demasiadas vezes mortal. O ambiente mais próximo (espaço doméstico), ou seja, o microssistema (família) não funciona para estas crianças vítimas de maus-tratos como um espaço seguro. Porquê? Perguntamos tantas vezes num misto de incredulidade, horror e emoção. Quando aprofundamos a leitura das notícias constatamos que por detrás estão com frequência quadros depressivos, alterações de personalidade e psíquicas momentâneas provocadas por diversos fatores: pessoais, familiares, profissionais, económicos, aditivos (drogas e alcoolismo)… Nada justifica, pensamos ainda. Mas com a mente humana o nada nunca é assim tão linear. O desemprego, a crise e as dificuldades económicas são fatores de risco a considerar, com efeitos negativos na criança, para além de que complicam a interação com novos ambientes proximais (mesossistema e exossistema) supostamente protetores, ou mesmo fora deles, incluindo a ajuda da comunidade/sociedade (macrossistema). Muitas vezes as famílias até estão referenciadas, no entanto, esse facto nem sempre evita a tragédia. Isto é, as instituições existem mas não funcionam a 100 por cento, geralmente por falta de verbas e de pessoal. O que nos remete de novo para a questão da “crise”, endémica em Portugal, que trava os possíveis apoios das estruturas sociais. As notícias passam e a sociedade, incapaz de dar uma resposta cabal, parece ignorar. A questão é que sem estes apoios, a criança fica ainda mais exposta, uma vez que os mesmos funcionam como fatores protetores (que contrabalançam os de risco e podem desencadear processos de resiliência, nos casos em que isso é possível). Para Ann Masten e Norman Garmezy, especialistas em resiliência, as redes de apoio social, com recursos individuais e institucionais, que encorajem e reforcem a pessoa a lidar com as circunstâncias da vida, são consideradas fundamentais para o desenvolvimento infantil, a par de outras defesas. A sua ausência é vista como um evento negativo, uma vez que as redes facilitam o estabelecimento de novos vínculos e são importantes fontes de informação. No seu livro Maus-tratos à Criança, Azevedo e Maia (2006) também sublinham o empobrecimento das famílias, agravado pela crise, como um fator de risco na ocorrência dos maus-tratos infantis, remetendo este facto para um problema de organização social da comunidade, ou seja, do macrossistema, podendo assim constatarmos ainda a influência deste meio no ambiente proximal da criança, no seu microssistema. O pedopsiquiatra chileno Jorge Barudy afirma mesmo que a organização das nossas sociedades gera desigualdades sociais, discriminação e exclusão social, o que favorece os maus-tratos infantis. Este autor acrescenta que a estas situações de carência socioeconómica em que as famílias se encontram (desemprego, precaridade, necessidade de casa, alimentação, saúde) se alia o sentimento de incompetência e incapacidade para resolução dos problemas e conflitos da vida quotidiana, já para não falar do stress que a mesma provoca, fator que tem vindo a ser cada vez mais associado ao abuso infantil. No entanto, e embora a crise e as más condições socioeconómicas sejam na realidade potenciadoras de situações de risco de maus-tratos para crianças e jovens, os especialistas chamam a atenção que a pobreza, descontextualizada, não pode ser considerada fator de risco a priori, embora dificulte em grande medida o desenrolar de processos de resiliência e de superação das condições de vulnerabilidade. Resumindo, os maus-tratos infantis e juvenis têm causas e modos de atuação para os enfrentar diversos, devendo por isso ser investigados sob uma perspetiva global e abrangente, tal como a análise baseada na articulação entre contextos, pessoa, processo e tempo permite. Modelo bioecológico do desenvolvimento humano O modelo preconizado por Urie Bronfenbrenner, especialista em desenvolvimento humano, estabelece que a pessoa é influenciada ao longo da vida por diferentes ambientes, contextos diversos (familiares, escolares, institucionais, sociais e comunitárias…), sendo que os mais próximos (microssistema) interagem progressivamente entre si (mesossistema) — e com os mais distantes (exossistema e macrossistema) — através dos objetos e símbolos do ambiente imediato por processo recíproco com a pessoa, e são considerados pelo autor os principais motores de desenvolvimento. Bronfenbrenner, em conjunto com Pamela Morris, teorizaram, em 1998, que as interações dentro do microssistema ocorrem tendo em conta os aspetos físicos, sociais e simbólicos do ambiente. Estão diretamente ligados às características do indivíduo, já que estas influenciam a forma, a força, o conteúdo e a direção dos processos proximais e são resultado da interação conjunta de todos os elementos: contexto, processo, pessoa e tempo. Por sua vez, o tempo permite examinar as mudanças ocorridas ao longo do ciclo de vida, em três níveis: microtempo (aspeto proximal), mesotempo (intervalos de semanas ou meses), macrotempo (nível mais alargado que abrange todo o ciclo de vida). Bronfenbrenner considera ainda a existência de interações condição fundamental para o bem-estar psicológico saudável das pessoas, principalmente se forem marcadas por sentimentos afetivos positivos, reciprocidade e equilíbrio de poder. Ou seja, é a qualidade das relações que torna os contextos de risco ou de proteção. Assim, esta abordagem defendida por este autor ajuda a que o desenvolvimento humano seja entendido de forma contextualizada e tendo em conta todas as interações daqueles quatro elementos o que, para os especialistas Houston, McLoyd e Jessor pode levar a evitar os equívocos frequentemente cometidos de entender o desenvolvimento de uma população, principalmente no caso de populações de risco, a que muitas crianças pertencem. Segundo as psicólogas Michele Poletto e Silvia Koller, as características dos contextos em que crianças e jovens se movem direta ou indiretamente são essenciais na hora de analisar o seu desenvolvimento e nível de risco. Por fim, e de acordo com Alessandra Cecconello, a análise ecológica revela-se ainda necessária no processo da resiliência, uma vez que ajuda a investigar a maneira como as pessoas percebem e enfrentam adversidades decorrentes dos processos proximais, bem como a influência do contexto e do tempo em que vivem. No caso de uma criança que foi violentada fisicamente, a maneira como ela lidará com esta situação dependerá do contexto no qual essa violência aconteceu, dos ambientes que frequenta, da sua rede de apoio, do seu momento de desenvolvimento, e das suas experiências, processos psicológicos e características individuais. Para saber mais:
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Por Ana Paula Medeiros A vinculação está relacionada com a necessidade primária de criar ligações afectivas, de ligar-se a outros seres humanos, como meio de assegurar a segurança e protecção. ![]() É um processo que se inicia no período da gestação e se estabelece ao longo do primeiro ano de vida, quando o bebé começa a criar uma relação privilegiada com o objeto materno que lhe proporciona os cuidados básicos, assegurando a sua sobrevivência. Quando nasce, os comportamentos inatos do bebé são acionados imediatamente, como o mamar, agarrar, seguir, chorar e sorrir. Estes comportamentos são utilizados para estabelecer o apego com a pessoa mais próxima e permanente e que assegura a sua sobrevivência. A interação precoce pais/bebé, tal como o contacto da pele, o toque, o calor físico e o estimulo verbal vão atuar na promoção do vínculo entre os progenitores e a criança, sendo que esta interação precoce trará efeitos positivos na qualidade do relacionamento dos pais com o bebé. Diferentes trabalhos de investigação mostram que no recém-nascido, a vinculação é predominante e pode proporcionar diversos benefícios:
Por Rita Costa, terapeuta da fala / Fale Connosco – Saúde Personalizada (www.faleconnosco-saude.pt) O ser humano é um ser social, comunicar é primordial e a fala é o veículo de comunicação privilegiado. Para os pais surgem muitas vezes inseguranças... ![]() Durante a gravidez os pais esperam ansiosamente a chegada do seu rebento, uma nova etapa, uma nova vida, um novo ser… Um ser que nasce e cresce impressionantemente rápido, as roupinhas deixam de servir, surgem novos gestos, novas gracinhas, novas vocalizações… Inicia-se o caminho da comunicação: um choro diferente para cada necessidade, um sorriso em resposta ao nosso sorriso, uma gracinha repetida para nos ver sorrir, a primeira palavra que nos faz celebrar, os primeiros passinhos que para nós merecem uma festa! O ser humano é um ser social, comunicar é primordial e a fala é o veículo de comunicação privilegiado. Para os pais surgem muitas vezes inseguranças: quando é que o seu bebé vai começar a falar? Será que já devia dizer mais coisas? Quando é que vai começar a fazer frases? Como é que eu devo levar para que me entenda? Para responder a estas e outras questões vamos percorrer as etapas de desenvolvimento linguístico até aos três anos, altura em que qualquer adulto deverá já compreender o discurso da criança, não esquecendo, no entanto que cada criança tem o seu ritmo de desenvolvimento que tem que ser respeitado. Se houver dúvidas, fale com o seu médico de família, com o seu pediatra e não deixe de consultar um terapeuta da fala, estes são os profissionais a quem deve recorrer para que sejam efetuados os despistes necessários e para que, em caso de necessidade, a intervenção seja o mais precoce possível. 0 aos 6 meses O que acontece? • Chora de forma diferente consoante as necessidades: Nas primeiras oito semanas de vida, o recém-nascido tem a sua comunicação muito reduzida, só tem à sua disposição o choro reflexo para expressar desconforto. A partir da 8ª semana o bebé torna-se mais responsivo, começa a saber manifestar a sua satisfação, o seu bem-estar, o gosto pela companhia dos interlocutores. Progressivamente o adulto vai conseguindo distinguir entre choro de dor (cólicas por exemplo), fome, sono, chamada de atenção por querer companhia … • Reage a sons e começa a dirigir o olhar e/ou a cabeça na sua direção. • Produz sons (sucção, arrotos, soluços, espirros, suspiros, palreio). • Manifesta os primeiros sorrisos intencionais, a primeira manifestação de bem-estar físico, psíquico e afetivo. • Começa a “conversar” (protoconversação), surgindo as primeiras alternâncias na tomada de vez da comunicação, a sobreposição das vocalizações do bebé e do adulto são menos frequentes. Conselhos • Escute e responda às iniciativas do bebé (choro, movimentos corporais, riso, olhar…): se por exemplo o bebé chorar com fome diga: “Calma bebé, a mamã já vai dar de mamar…”. • Cante e ria com o bebé: O canto acalma os nossos bebés e o riso é por excelência uma manifestação de bem-estar. • Fale com calma com o bebé: aqui as rotinas diárias têm uma importância crucial, constituirão as bases para as primeiras aprendizagens semânticas, utilize frases simples e: – Explique-lhe o que ouve; – Explique-lhe o que faz durante a alimentação, higiene… – Nomeie pessoas familiares e objetos do dia-a-dia. Sinais de Alerta Não reage aos sons. Não estabelece contacto ocular. 6 aos 12 meses O que acontece? • Balbucio reduplicado: Mais do que produzir sons começa a produzir cadeias vocais dos mesmos sons repetidos /mamamamama/, /tatatatata/, /bababababa/ e consegue produzi-los durante bastante tempo seguido. • Reage ao seu nome, olhando para si quando o chama. • Reage quando o adulto nomeia objetos do uso comum, por exemplo se o adulto nomear um brinquedo que o bebé goste, ele vai querer alcançá-lo ou olhar na sua direção. • Diiz uma ou duas palavras, habitualmente “mamã” ou “papá” porque contêm consoantes bilabiais, as mais fáceis a ser aprendidas por serem as mais visíveis. Conselhos • Encoraje todos os tipos de interação (expressão facial, riso, olhar…), ajude o bebé a descobrir o prazer da comunicação. • Dê tempo ao bebé para responder: É importantíssimo estimular a troca de turnos durante a comunicação e isto pode ser feito durante um qualquer jogo, por exemplo de encaixes, eu encaixo, tu encaixas… A imitação é também um ponto de partida para o turn-taking, o bebé faz, o adulto imita e o bebé volta a imitar. • Responda ligeiramente acima do nível das produções da criança: Aqui o importante é que expanda os enunciados da criança, por exemplo, a mãe está a brincar com a criança e o bebé produz /mamamamama/, a mãe pode dizer: “/mamamama/, sim a mamã está aqui, a mamã está a brincar com o bebé”. Sinais de Alerta Não reage ao seu nome. Não reage a sons familiares como o telefone. Deixa de produzir sons. 12 aos 18 meses O que acontece? • Identifica objetos de uso comum. • Compreende verbos de ações relacionadas com a vida diária. • Diz palavras isoladas com sentido de uma frase (ex.: dá, pai, mãe). • Repete palavras familiares. • Imita ações do adulto. Conselhos • Responda ligeiramente acima do nível das produções da criança. • Dê o modelo correto, mas atenção que nesta idade é normal que a criança não diga as palavras corretamente, o importante nesta fase é que as diga e não como as diz. • Mostre-lhe livros e fale sobre eles. Sinais de Alerta Não usa palavras isoladas Não reage quando brincam com ele (ex.: olhando ou sorrindo). 18 aos 24 meses O que acontece? • Identifica objetos e imagens de objetos. • Identifica partes do corpo. • Compreende ordens simples (ex.: "anda cá"). • Diz o seu nome. • Junta duas palavras em frases simples (ex.: "não quero"). Conselhos • Enriqueça o seu vocabulário nas situações do dia-a-dia, bem como as frases, por exemplo se a criança disser “popó aqui”, o adulto pode dizer “O popó está aqui”. • Produza palavras que ele não utiliza. Sinais de Alerta Não compreende ordens simples. Não produz mais do que cinco palavras. 2-3 Anos O que acontece? • Brinca ao faz de conta, por exemplo dar de comer a um boneco. • “Idade dos porquês”. • Grande expansão de vocabulário. • Nomeia e diz para que servem objetos comuns. • Identifica imagens de ações. • Identifica grande, pequeno e muito. • Produz frases com quatro palavras (ex.: Eu quero um gato!; Hoje vou à escola!; Eu gosto de gelado!). • Começa a produzir frases coordenadas (ex.: "Eu quero um gato e um cão."). • Utiliza predominantemente substantivos. • Utiliza verbos, adjetivos, determinantes, pronomes pessoais, alguns advérbios e preposições. • Já começa a fazer a variação em género e número. Conselhos • Envolva a criança nas atividades do dia-a-dia. • Reserve tempo para ouvir a criança e responder-lhe. • Expanda os seus enunciados, por exemplo se a criança disser "comer", diga "Vamos comer a sopa". • Façam jogos em que cada um joga na sua vez (lotos de imagens, de identificação de sons, de associação de pares, cores...) • Se a criança ainda usa o biberão e/ou a chupeta, encoraje-a a deixar de usar! Sinais de Alerta Não junta duas palavras em frases simples (ex.: "dá pão"). O discurso não é inteligível. Não se esqueça que a criança precisa de crescer e aprender e os adultos são o modelo, só através deles aprenderá a usar a linguagem adequadamente! Saber mais Prevention: Developing Language, disponível em www.cplol.org Rebelo, Ana e Vital, Ana. Desenvolvimento da linguagem e sinais de alerta: Construção e validação de um folheto informativo. Re(habilitar), nº 2, Edições Colibri, 2006, pp.69-98. RIGOLET, Sylviane A.. Os Três P (Precoce, Progressivo, Positivo): Comunicação e Linguagem para uma Plena Expressão. Porto: Porto Editora, 2000. SIM-SIM, Inês. Desenvolvimento da Linguagem. Lisboa: Universidade Aberta, 1998. Ato saudável, que acompanha o ser humano desde tenra idade, o brincar permite aos adultos um afastamento da realidade. Todavia, para as crianças é um ato sério, afinal, entre outras coisas, ajuda-as a entender o mundo. ![]() Brincar é uma das primeiras formas de comunicação. Forma esta que permanece ao longo da vida. As crianças de outrora, apesar de adultos, não colocam totalmente de lado o ato de brincar. Ato que difere com as várias fases da vida. Se com um ano brincar implica, por exemplo, manusear um boneco de peluche, volvidos 10 anos já poderá implicar construir um puzzle. Solitárias ou acompanhadas, as brincadeiras integram o quotidiano de miúdos e graúdos. «Os adultos gostam de brincar porque é uma forma de se afastarem da realidade. Mas, para as crianças, brincar é um ato sério, que lhes permite encontrar prazer consigo próprio e nas relações e aprender», afirma Cecília Galvão Azevedo, psicóloga infantil. Conforme explica, «as brincadeiras não são iguais em todas as etapas do desenvolvimento. Quando o bebé completa um ano de vida ainda não tem a consciência total da realidade. Nesta idade, o jogo está relacionado com o próprio corpo, com o espaço e com os pais». Entre os dois e os três anos, o mundo adquire uma nova dimensão. A criança já tem uma certa autonomia motora e começa a usar a linguagem verbal. Inicia, pois, o jogo pré-simbólico, em que, por exemplo, brinca com um telefone falso com a intenção de imitar os adultos. Nos dois anos seguintes, tem capacidade para estabelecer relações não só com os seus pares como com pessoas mais velhas. Aparece o jogo simbólico de comportamentos e atitudes, sendo muito importantes as atividades de grupo e destreza. Diz a psicóloga que «dos seis aos 10 anos, o mundo enche-se de relações, informações, escolhas, valores e espaço. A criança explora e constrói de forma mais autónoma e, em determinadas ocasiões. É também nesta fase que o pensamento adquire a capacidade lógica concreta. A atividade lúdica é conduzida através dos desafios, da amizade e das tarefas realizadas em grupo». Ao longo da infância, o brincar possibilita à criança gostar dela própria, entender o mundo, interpretar sinais e reconhecer situações. É a brincar que testa as suas capacidades físicas, aumenta competências motoras, experimenta alguns papéis e percebe algumas situações do quotidiano. «Brincar permite gerir os conflitos e as frustrações porque a criança compreende que é necessário haver partilha de responsabilidades. Permite, ainda, aprender a conciliar, a argumentar e a gerir as derrotas e as vitórias», menciona Cecília Galvão Azevedo, concluindo: «É fundamental brincar e jogar para aprender a viver amando, sabendo, criando e divertindo-se.» Não brincar e outros comportamentos anormais Se uma criança não brinca, ou se brinca de forma estranha comparativamente com os seus pares, significa que pode sofrer de uma doença psicológica ou fisiológica. São várias as situações que originam a ausência de brincadeiras. Pode ser uma manifestação ou uma consequência de algum acontecimento traumático (maus tratos, abuso sexual, acidentes de viação, etc.), dentro ou fora do contexto familiar. Os motivos orgânicos, associados a doenças neurológicas, constituem outra explicação. Nestes casos, surgem alterações específicas e cognitivas, que retiram às crianças as suas competências neurológicas ou orgânicas para poder brincar. É possível, ainda, que seja de índole emocional. É a causa mais complicada de diagnosticar e manifesta-se muito através da depressão infantil. Além do não brincar, os pais e todos aqueles que – direta ou indiretamente – são responsáveis pela formação da personalidade dos adultos de amanhã devem estar atentos a determinados comportamentos adotados durante as brincadeiras. Serve de exemplo o isolamento, os comportamentos repetitivos, a fixação em determinado objeto ou parte dele, os jogos com temáticas recorrentes, a violência excessiva ou a forte carga erótica. Texto: Sofia Filipe (Jasfarma) Os sentidos de um recém-nascido vão despertando à medida que ele se acomoda no novo mundo e toma contacto com as imagens, os sons, os sabores e as texturas, primeiro estranhos, depois familiares e fonte de prazer. ![]() © Nick_thompson | Stock Free Images & Dreamstime Stock Photos Um bebé pouco parece fazer mais do que dormir, comer, chorar e… sujar fraldas nas primeiras semanas de vida. pouco ou nada parece aperceber-se do novo mundo que o rodeia, mas na verdade os seus cinco sentidos estão a funcionar e alerta e ele vai captando todos os estímulos – os sons, as luzes, os cheiros… E vai reagindo. Difícil é saber o que motiva essas reações, mas elas acontecem de uma forma bem mais complexa do que o escasso tempo de vida deixaria antever. Visão - o fascínio dos rostos Quando nascem, os bebés veem apenas formas nubladas, esborratadas, e isto porque a sua capacidade de visão à distância ainda não está plenamente desenvolvida. Mas são capazes de ver um rosto que lhes esteja muito próximo: é por isso que reconhecem facilmente, e antes de tudo, o rosto da mãe ou de outro cuidador habitual – dar de mamar ou o biberão obriga a um contacto visual (e físico) muito estreito, facilitador desta forma de comunicação (e de intimidade). Mas rapidamente esta limitação é superada e pelos três meses os bebés já são capazes de reconhecer o rosto de qualquer pessoa que se aproxime. Os rostos humanos são, aliás, um dos primeiros motivos de brincadeira dos bebés: basta atentar no modo como reagem perante a sua própria imagem num espelho… A visão vai assim ganhando definição, mas também contraste: é essa, aliás, a função dos objetos coloridos que habitualmente pendem do berço e dos primeiros brinquedos – ajudam a distinguir a cor (além da forma), por contraste com os tons mais suaves que os bebés têm dificuldade em apreciar. As cores fortes – o vermelho, o amarelo, o verde e o azul – são, pois, preferíveis às mais discretas. Ao longo dos três primeiros meses de vida, também a coordenação dos olhos vai melhorando: entre o segundo e o terceiro mês, os bebés são já capazes de seguir um objeto num movimento de 180 graus (metade de uma circunferência). Daí o benefício dos “mobiles”, que, além disso, ajudam a despertar a coordenação mão-olho: é que, perante o movimento com cor, os bebés tendem a esticar-se para tocar nos objetos. Uma nova fase ocorre entre os quatro e os sete meses. A interação dos bebés com o meio ambiente vai aumentando – é ver como estão atentos no carrinho de passeio sempre que saem de casa – e, com ela, a acuidade visual. A pouco e pouco, começam a concentrar-se nas imagens, por exemplo na do brinquedo que agarram. Continuam a ver melhor ao perto, mas já conseguem focar-se em objetos mais distantes, distinguir cores e seguir movimentos, ao mesmo tempo que vão praticando a coordenação entre as mãos e os olhos. Pode parecer precoce, mas nesta altura os bebés beneficiam, e muito, de novas experiências visuais: há que alargar horizontes, passeando-os por locais diferentes, com estímulos diferentes – o jardim zoológico, por exemplo, é uma boa opção. Pelos oito meses, os bebés já veem bastante bem e são capazes de se fixar em objetos em movimento rápido. E são já capazes de colocar as suas capacidades motoras em ação para ir ao encontro desses objetos – por exemplo, gatinhar e ir buscar uma bola que rolou para um canto do quarto. Até completar um ano, continuam a preferir olhar para os rostos familiares, não se cansando da mesma imagem. E começam já a associar os estímulos visuais a palavras, pelo que aos espaços devem ser atribuídos os respetivos nomes. ![]() © Prometeus | Stock Free Images & Dreamstime Stock Photos Audição - o poder da voz Inicialmente, os bebés comunicam através dos sons – choram. Para manifestar qualquer desconforto – fome, frio, calor, dor, fralda suja… - ou apenas porque sim, para pedir colo. Além dos sons que assim emitem, os seus preferidos são a voz da mãe (e do pai ou de outra pessoa que deles cuide habitualmente): falar, cantarolar são fundamentais para estabelecer comunicação. E há que aproveitar o balbuciar infantil, repetindo os sons que os bebés emitem e esperandoque eles façam outros – é assim que se conversa. Até aos três meses também apreciam música, pelo que é uma boa ideia proporcionar-lhes o contacto com brinquedos musicais. Apreciam igualmente os sons do quotidiano – os ruídos da casa, os risos dos irmãos ou de outras pessoas. Mas as vozes continuam a ser fundamentais: nos meses seguintes eles aprendem a distinguir os tons – é por isso que uma voz calma pode fazê-los parar de chorar e um tom mais elevado pode fazê-los sentir que algo está mal. Começam, assim, a reagir ao “não” e a novos sons, como o ladrar de um cão. Pelo sétimo mês, já reconhecem e respondem ao próprio nome, ao mesmo tempo que tentam imitar sons e dedicam mais tempo à “conversa”. Não devem ser ignorados nestas tentativas, mas sim encorajados o mais possível: é a fala a desenvolver-se. O leque de sons que os bebés identificam vai-se alargando a pouco e pouco. Ao nono mês já conseguem juntar alguns desses sons e, eventualmente, formar palavras verdadeiras, como “mamã”. E um sinal importante é dado quando reagem a determinadas palavras, quando, por exemplo, lhes perguntam “onde está o pai” e eles olham para o pai ou quando lhes dizem “vai buscar a bola” e eles vão. É sinal de que têm estado atentos… No final do primeiro ano de vida, é de esperar que reajam a pedidos simples como “diz adeus”, tenham pelo menos uma palavra verdadeira no vocabulário, tentem manter uma conversa, mesmo que seja com “gu-gu da-da”. Cheiro e paladar – quanto mais doce melhor Estes são dois sentidos intimamente ligados, assumindo-se que os bebés detetam cheiros porque detetam sabores. E em matéria de sabores sabe-se que preferem os doces desde o nascimento, mas a verdade é que nos primeiros meses não há muito a dizer na medida em que o único sabor que conhecem é o do leite, materno ou não. Mas, a partir do momento em que começa a diversificação alimentar, é todo um novo mundo que se abre. Despertam para os sabores, mas também para os cheiros, pois entre os quatro e os sete meses já reagem às refeições familiares. Entre os oito e os doze meses já têm uma boa ideia dos diferentes sabores e, sobretudo, dos que apreciam e dos que não apreciam. É natural que continuem a preferir os mais doces, mas há que insistir, oferecendo-lhes alimentos variados. Neste intervalo, começam a distinguir outros odores que não os da comida. E quer os sabores, quer os cheiros, devem ser identificados pelo nome. É, mais uma vez, uma forma de estimular a linguagem e a fala. ![]() © Netris | Stock Free Images & Dreamstime Stock Photos Tato – lugar ao afeto O desenvolvimento deste sentido está dependente, nos primeiros três meses de vida, quase exclusivamente dos pais: os bebés sentem-se amados porque os pais lhes tocam, os abraçam, mimam, beijam. O toque desempenha, aliás, um papel fundamental no crescimento e até na saúde dos bebés. E há que estimular este sentido, proporcionando-lhes o contacto com diferentes texturas, das mais suaves às mais duras, das mais quentes às mais frias. E, claro, usando as palavras certas para as descrever. Até ao primeiro ano de vida, são muitas as oportunidades para exercitar o tato, as quais surgem à medida que os bebés conseguem coordenar os movimentos. Há que deixá-los explorar o terreno, por assim dizer. Mas tendo o cuidado de prevenir acidentes, retirando do seu alcance objetos que possam colocar na boca ou com que se possam magoar. São descobertas enriquecedoras mas que não eliminam nem substituem a necessidade do toque principal: o do afeto. Há que continuar a abraçar, massajar, beijar os bebés para que eles se sintam seguros e amados. O pleno desenvolvimento dos cinco sentidos acontece progressivamente: é um processo por etapas, com balizas mais ou menos marcadas mas que cada bebé pode percorrer ao seu ritmo próprio. Mas se tiver alguma suspeita sobre a capacidade do seu bebé para ver ou ouvir, por exemplo, nada melhor do que falar com o médico de família ou o pediatra: se houver algum atraso, quanto mais cedo for detetado melhor. Fonte: Farmácia Saúde |
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